sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

As pequenas coisas.


Quando menos esperamos, algumas coisas boas nos acontecem. Coisas pequenas, mas capazes de fazer aguentar um dia não muito confortável.

Ainda a pouco, saia de casa, mais uma vez na chuva. Mas estava tão rala, que mal molhava. Não mais que um quarteirão, a primeira avenida, uma espera novamente para o bonequinho do sinal ficar verde. Alguns passos apressados para aproveitar a brecha entre os carros e eis que um "quase" senhor que atravessava do meu lado, me olhou algumas vezes (que pude reparar pelo canto dos olhos) antes de tomar alguma decisão. Mas não mais que 10 segundos e ele apressa os próprios passos e um tanto acanhado pergunta: "quer uma carona no quarda-chuva?". Reparei no rosto que me perguntava isso, uma bondade sincera me olhava de volta enquanto piscava forçadamente para evitar a chuva que batia no rosto. Mas minha timidez de andar tão perto de alguém desconhecido me refreeou e agradeci educadamente e disse que era um prazer andar na chuva. Ele deu mais um passo para meu lado, terminamos a primeira rua, e na segunda, já debaixo do guarda-chuva dele, que era um tanto quanto enorme ele me disse. "Não é incomodo para mim, se for para você tudo bem, mas hoje o dia está frio, você pode pegar um resfriado e você já está encolhida dentro do moleton.". Ele me disse que ia para a rua João Pinheiro, exatamente a que eu ia, porem ele iria dece-la e eu subi-la. E a conversa é a mesma entre estranhos, perguntando se é da capital, se estuda ou trabalha. Como não estava longe de meu destino, pouco se poderia falar e a rua já estava a nossa frente. Já ia me agradecer da disposição dele me acompanhar quando ele me disse que subiria os dois próximos quarteirões comigo, que ele teria outro ponto logo a frente, e não deixaria de ser um caminho para ele. Confesso que me assustei, não de medo, mas de encontrar alguém, diante de um transtorno causado pela chuva, pela pressa de cumprir horários e pelo humor cinzento que ingrato que há nesse mundo, alguém que se importou o suficiente em mudar o seu caminho por um rosto estranho. E dois quarteirões pra frente, eis que nos apresentamos, e o senhor Sérgio me desejou felicidades e seguiu por seu caminho e eu pelo meu.

Cheguei onde devia. Encontrar minha prima para um café.
E escutar justamente o que eu precisava de ouvir.
Um passo para dar uma aliviada no coração que mal respirava.
Por mim, seria ali o fim dos meu planos do dia. Estava pronta pra voltar pra casa.
Mas, acabei ficando com ela até fechar o serviço e saimos para uma pizza. E algo que menos ainda esperava que acontecesse no meu dia, encontrar com tias e outra prima que há muito não via. Resultado foi um dia alegre e necessário diante de tantos conflitos que venho presenciando.
Uma noite fria pelo vento que batia nas costas, mas calorosa pelas pessoas ao meu redor, pelos risos e sorrisos e conversas sobre a vida.

A noite chega. Tanto a pensar, tanto a refletir.
O sono se vai, mas depois chega pra aconchegar.
Aconchego que se vai com o nascer do dia.
Tem horas que só queria dormir.

Compromissos a parte.
Acordei afetada pelo Sérgio, o estranho do guarda-chuva. Dia cansativo, gastei todas as minhas lembranças geometricas e historicas em provas que tinha que fazer.
O corpo doia, mas não sabia porque. Peguei o onibus praticamente vazio em seu primeiro ponto. Mas que se encontrava insuportavelmente cheio no segundo. Apesar da dor, cedi meu lugar para uma senhora que estava em pé do meu lado. Um trânsito infernal que nunca acabava misturado a crises de falta de ar. Fechava o olho rezando para que meus joelhos me aguentassem.
Aguentaram.
E a noite me trouxe mais uma insônia e uma decepção.
Meus pontos não eram o suficientes em uma das provas.
Me afundei em músicas desconhecidas e parei para sentir cada uma delas e a madrugada me acolheu.

E o dia sempre a me receber com pequenas alfinetadas. Acordei estranha o suficiente para arrumar a casa inteira. Inclusive coisas que tinha prometido deixar de lado. Mas acabou que serviu como uma distração. E mais tarde acabei saindo pra clarear os pensamentos.
Ouvir, perceber, falar, admirar e desejar que algumas coisas fossem diferente.
Tomei um café, onde uma menina sozinha, de uns 13 anos tentava ganhar moedinhas para o seu Natal. Não sei quantas vezes o sinal parou e não sei quantas vezes vi seu olhar tristonho após cada um deles, sem ganhar uma moedinha mísera de um centavo. Enquanto o sinal abria para os caros ela ia para a sombra e cantava alguma coisa que não dava para escutar.
Refleti sobre a música, a mesma que me acompanha todos os dias, deixando-o mais aceitável, era a mesma que ela cantarolava após mais alguns nãos seguidos de outros nãos e vidros fechados sem respostas. Eu sei que não tinha um olhar de felicidade no meu rosto, mas ainda assim uma hora ela atravessou a rua e me pediu um trocado, e pude ver que ela já lacrimejava um pouco. Eu disse para ela voltar, que o sinal tinha ficado vermelho de novo, e que eu ia pagar meu café e daria o troco para ela. Ela sorriu, mas ainda desconfiada que fosse só mais uma das milhares de desculpas que ela escuta para nao ganhar dez centavos.
O sinal ficou vermelho novamente, e eu nao pedi que ela atravessasse, fui até ela, dei o um real de troco, tudo que sobrou, em várias moedas.
O brilho nos olhos dela e a vontade que ela me desejou que eu tivesse um ano melhor, e um bom Natal para mim e minha família, foi muito mais importante do que qualquer valor que aquele um real poderia ter para mim. Toquei seus ombros e olhei nos olhos dela, desejei um ótimo Natal e Ano Novo para ela também, e que as coisas pudessem melhorar. Ela deu outro sorriso largo e voltou para os carros.


Foto: Link

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